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Votar também é dizer não

Fevereiro 7, 2005

Não desconhecemos, evidentemente, que uma eleição legislativa sobreleva em muito a escala local, ou mesmo regional, e que as grandes propostas e opções políticas que estão em cima da mesa são principalmente de âmbito nacional, ainda mais quando vivemos tempos difíceis, porventura decisivos para a definição do nosso futuro colectivo enquanto País.

Temos igualmente presente que o nosso sistema eleitoral e constitucional estabelece que os deputados a eleger para a Assembleia da República representarão o todo nacional e não a sua região ou distrito e que os diversos programas de governo que nos são agora apresentados como propostas políticas raramente contêm a concretização de medidas de natureza estritamente regional ou local que possamos ponderar e ter em conta na hora da nossa opção eleitoral.

Ainda assim, podemos perfeitamente fazer o balanço dos efeitos da acção governativa no local onde residimos e trabalhamos e avaliar o trabalho desenvolvido pelos agora candidatos a deputados (sobretudo se ocuparam cargos executivos e de responsabilidade política no passado recente), estar atentos ás suas declarações e compromissos no período eleitoral e projectar a partir dessa análise os seus previsíveis posicionamentos no futuro próximo quando estiverem em cima da mesa assuntos relativos à nossa região ou localidade.

Naturalmente que na opção a tomar estarão ainda em causa princípios de natureza ideológica, mais ou menos racionalizados, mais ou menos afectivos, de acordo com o quadro axiológico de cada um; também será seguramente importante a leitura que fazemos da actual conjuntura político-partidária, nomeadamente da confiança que depositamos nesta ou naquela personalidade para liderar o próximo governo ou para nos representar no parlamento; outro critério que contará para a tomada de decisão será talvez a questão da utilidade do voto, de acordo com a probabilidade maior ou menor de eleição de deputados por este ou aquele partido tendo em conta os resultados das anteriores eleições no mesmo círculo eleitoral; finalmente, importa ter em conta que numa eleição não está somente em causa a escolha de um candidato ou de uma proposta partidária, mas igualmente a possibilidade de rejeitar um outro candidato ou um determinado projecto político.

Dito isto, o Alto Minho, e Caminha em particular, têm no próximo dia 20 de Fevereiro uma escolha (e, simultaneamente, uma rejeição) fundamental numa eleição em que está em disputa a eleição de seis deputados pelo círculo eleitoral de Viana do Castelo: optar pela listas do Partido Social Democrata (PPD-PSD) ou do Partido Popular (CDS-PP) ou, em contrapartida, votar nas listas do Partido Socialista (PS), ou da Coligação Democrática Unitária (CDU) ou ainda do Bloco de Esquerda (BE).

Por um lado, as listas dos dois partidos da actual coligação (PPD-PSD, CDS-PP) que, entre muitas outras provas de incompetência governativa, demonstraram na nossa região, e no concelho de Caminha em especial, um profundo e chocante desprezo pelas pessoas e pelo património ambiental e cultural quando, directa ou indirectamente, assumiram a responsabilidade por duas estruturantes decisões: a aprovação política de um desastroso traçado do IC1/A28, sempre rejeitado pelas freguesias afectadas e sucessivamente reprovado pelos técnicos; o aberto patrocínio do inesperado, e pouco ou nada debatido ou justificado, afastamento do nosso concelho do espaço político-territorial do Vale do Minho, onde estava há muito integrado numa comunhão de projectos e afectos entre concelhos iguais, atirando-o para o seio de uma associação de municípios já em andamento e onde não será fácil a Caminha fazer valer os seus interesses e especificidades.

Por outro lado, as listas dos partidos (PS, CDU, BE) que, na Assembleia da República, na Assembleia Municipal e nas reuniões da vereação da Câmara de Caminha e até na rua, estiveram no essencial ao lado das populações e do debate esclarecedor nas questões referenciais que citei, sobretudo no que diz respeito ao IC1/A28. Este é o tempo certo para recordar esses posicionamentos partidários e pessoais, entretanto reafirmados na presente campanha eleitoral, mesmo se estamos conscientes de que não será agora fácil reverter factos consumados e opções já tomadas.

Vistas de Caminha, no momento em que as obras de uma estrada ainda sem fim à vista (por culpa, precisamente, dos que não quiseram ouvir as populações) vão paulatinamente destruindo as encostas do Vale do Coura e, depois do Vale do Âncora e de Argela, a minha freguesia de Vilar de Mouros se prepara para o embate terrível das retroescavadoras, as eleições do próximo dia 20 de Fevereiro, colocam-nos a todos e a cada um de nós, face a uma escolha e a uma rejeição claras.

Eu, pelo meu lado, não tenho dúvidas: não ocultando o meu posicionamento ideológico de sempre à esquerda, pesando realisticamente os efeitos da proporcionalidade eleitoral no círculo de Viana do Castelo mas, principalmente, exercendo o meu direito de cidadania para rejeitar a política da arrogância, da intimidação e da tecnocracia, vou procurar contribuir para a derrota daqueles que nos últimos anos detiveram responsabilidades políticas nacionais, distritais e locais sem nenhum “Amor pelo Alto-Minho”, ou por Caminha já agora.

Sidónio como arma política

Novembro 22, 2004

Quando se esperava que, finalmente, fosse apresentado aos caminhenses o projecto de reconstrução e animação da casa onde Sidónio Pais nasceu em 1872 e que, há já algum tempo, foi adquirida pela Câmara Municipal de Caminha, surgiu agora em vez disso uma enorme tela envolvendo o imóvel da Rua Direita, aparentemente para preservar do olhar público o estado avançado de ruína em que se encontra.

Precisamente por não conhecer esse projecto que, espero, nos ajudará a compreender as eventuais vantagens da iniciativa do executivo municipal, não pretendo debater nesta oportunidade a compra do edifício em causa, mesmo se me interrogo se não haveria melhor destino para os escassos meios financeiros sempre disponíveis para a salvaguarda do património concelhio, do que a aquisição de um imóvel em avançado estado de degradação e onde, afinal, o quarto Presidente da República Portuguesa viveu somente até aos dois anos de idade. Quando, mesmo ali ao lado, prossegue a longa e penosa agonia do Teatro Valadares, aguardo pois que seja rapidamente desvendado o projecto museológico e pedagógico subjacente a este dispêndio de dinheiros públicos, esperando, nomeadamente, que a quantidade e a significância do espólio pessoal de Sidónio Pais que ali ficará exposto justifique a abertura de mais um espaço municipal.

O que provoca esta breve nota crítica é pois a tela agora mandada colocar pelos responsáveis camarários, não propriamente a sua estética ou grafismo (sobre isso haverá certamente outros melhor habilitados do que eu para o fazer), mas os textos aí impressos. Entre alguns registos biográficos meramente informativos, e que naturalmente não discutimos, chamou-nos a atenção um texto historiográfico em especial que sobressai pelo seu carácter hagiográfico e pelo evidente tom nacionalista que utiliza para caracterizar a acção de Sidónio Pais. Apesar de não assinado, o que se estranha dado estarmos perante um texto claramente opinativo, informe-se em abono da verdade que foi retirado da monografia “Caminha e o seu Concelho”, editada em 1985 pela Câmara Municipal de Caminha, sendo por conseguinte da autoria de Lourenço Alves. Não estando obviamente em causa a figura do eminente historiador e investigador local e meu prezado colega, que não terá sido sequer ouvido sobre a exposição agora dada a um escrito seu de há vinte anos, diga-se contudo que se trata de uma escolha infeliz e passo a explicar porquê.

Talvez como nenhuma outra figura política na nossa história recente, a vida e a obra de Sidónio Pais foram desde sempre objecto de uma intensa e extremada polémica político-historiográfica que, partindo de posições de princípio opostas, contribuíram paradoxalmente para uma mesma imagem, como se fossem o positivo e o negativo de uma mesma fotografia : o Sidónio ditador, germanófilo e proto-fascista, demonizado pela esquerda republicana e, mais tarde, pela oposição democrática, correspondia afinal ao Sidónio messiânico, salvador da pátria e percursor de Salazar que a direita integralista, primeiro, e o Estado de Novo depois, se encarregaram de construir e usar politicamente. Foi com este perfil profundamente ideologizado que a figura histórica de Sidónio Pais chegou ao 25 de Abril, não surpreendendo pois a rejeição generalizada, e muitas vezes primária, de que foi alvo a sua memória na época do PREC, a que não escapou até a sua terra natal, Caminha, com episódios que marcaram então impressivamente a vida política local.

 

Ora o texto de Lourenço Alves, agora recuperado e aumentado para exibição em tela gigante, não pode escapar à época e ao contexto em que foi escrito e, mesmo se não intencionalmente, reflecte sobretudo uma reacção ideológica a esses acontecimentos fracturantes e daí as referências, possivelmente incompreensíveis para os mais jovens, às “utópicas ideologias” e à “crosta da aleivosia” dos que eram acusados de contribuírem para a conotação negativa que rodeava então a figura de Sidónio.

 

Estranha-se, por conseguinte, a escolha deste texto como referencial historiográfico no presente, sobretudo quando os últimos anos viram surgir uma série de estudos*, um deles até apoiado pelo município caminhense, que, meritoriamente, pretendem ultrapassar as visões partidárias até aqui prevalecentes, substituindo-as pelo rigor da investigação e procurando dessa forma conhecer, sem preconceitos mas com espírito crítico, o verdadeiro Sidónio Pais, militar, académico, diplomata e político. É que a realidade dos factos é sempre mais complexa do que as simples opiniões, por muito respeitáveis que estas sejam, e se é certo que Sidónio mandou encerrar lojas da maçonaria, não é menos verdade que ele próprio era mação desde 1911 ; quando se diz que estava “identificado com os valores tradicionais do país”, há contudo que ressalvar que era agnóstico e defensor da escola neutra; quando se acusa os “democratas” de terem provocado a sua morte (dever-se-ia grafar “democráticos” para denominar os adeptos do Partido Democrático, sendo que esta inexactidão se repete ao longo do texto o que, para os menos conhecedores da história da 1ª República, pode ser fonte de equívocos), é preciso dizer que tal nunca foi provado, tudo apontando para um acto isolado de um indivíduo que, aliás, acabou os seus dias no hospício…

 

Concluindo, mesmo tendo em conta o facto de estarmos perante uma estrutura temporária (mas, por quanto tempo ?), foi sem dúvida infeliz a sua execução, e só se espera sinceramente que tal se deva a um lapso de quem recorreu ao único livro que conhecia relacionando Sidónio Pais com Caminha, e não a uma qualquer intencionalidade prenunciadora de uma deriva nacionalista e de uma utilização de Sidónio como arma política que, a acontecer, terá como consequência inevitável o regresso ao maniqueísmo redutor das visões ideologizadas e partidárias que sempre perseguiram a figura do estadista caminhense. Ninguém ganhará com isso, sobretudo a memória de Sidónio Pais.

 

 * Ramalho, Miguel Nunes (1998). Sidónio Pais, Diplomata e Conspirador (1912-17) . Lisboa: Edições Cosmos; Silva, Armando B. Malheiro da & Trigueiros S.J., António Júlio Limpo (1999). Sidónio Pais – De Caminha ao Panteão Nacional. Viana do Castelo: Centro de Estudos Regionais.

 

O que se passa no Coto da Pena?

Fevereiro 9, 2004

 

Como professor de História na EB 2,3/S de Caminha há já algum tempo que me ia angustiando com o que diariamente observava da sala de professores da minha escola: máquinas escavadoras rapando metodicamente a encosta do Coto da Pena e a aproximar-se perigosamente do núcleo arqueológico castrejo aí existente, à medida que frias muralhas de betão alteravam profundamente a configuração de uma elevação que, apesar de já muito flagelada pela construção habitacional das últimas décadas, conservava ainda uma réstia da primitiva altivez própria de um núcleo fundador.

 

Para os menos conhecedores da história e do património do concelho de Caminha, importa referir que o eucaliptal e o silvedo que, fruto da incúria de muitos anos, por ali crescem livremente, escondem uma estação castreja cujas estruturas e espólio indicam uma ocupação humana ao longo de cerca de vinte séculos, da Idade do Bronze à Idade Média, de acordo com as conclusões da intervenção aí efectuada em 1984 e 1985 sob a direcção do arqueólogo e professor da Universidade do Porto, Armando Coelho (A Cultura Castreja no Noroeste de Portugal, 1986). Trata-se, por conseguinte, de um importante testemunho do passado histórico caminhense, justamente classificado como imóvel de interesse público desde 1986 e que, juntamente com a Anta da Barrosa, o Dólmen de Vile, a Cividade de Âncora e a Laje das Fogaças em Lanhelas, constituem o núcleo fundamental da Pré-História de Caminha.

 

Interrogando-me sobre o que justificaria a movimentação de maquinaria pesada numa zona tão sensível, confesso que num primeiro momento ainda julguei tratar-se de uma intervenção das autoridades públicas, possivelmente reparando a cerca ali colocada depois das escavações e há muito caída ou, quem sabe, efectuando algum necessário trabalho de contenção de terras antes do Inverno chuvoso. As minhas ilusões foram contudo rapidamente desfeitas: no passado dia 9/1/04, um aviso da Câmara Municipal de Caminha publicado na imprensa caminhense, esclarecia ter sido emitido um alvará de licença de loteamento para aquele local, prevendo a edificação de sete lotes com um volume total de construção de mais de seis mil metros cúbicos, tudo em área abrangida pelo Plano Director Municipal (PDM) de Caminha.

 

Esclarecido mas não convencido, eis que sou agora surpreendido com a notícia publicada no Jornal de Notícias de 4/2/04 denunciando que o Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR), alertado para o que estaria ali a suceder, teria solicitado à Câmara Municipal de Caminha que procedesse à paragem das obras até ao fornecimento de elementos mais detalhados sobre o processo, o que o contínuo movimento das máquinas obviamente indica não ter acontecido.

 

Calculo que alguns dirão que o facto do PDM de Caminha aparentemente legitimar o que está a acontecer no Coto da Pena resolve, sem mais, a questão. Outros argumentarão que viabilizações passadas para outras habitações que já lá se encontram edificadas à mesma cota abriram um precedente justificativo deste novo loteamento. Pelo contrário, eu considero que a salvaguarda do património municipal não deveria estar nunca condicionada a decisões anteriores manifestamente erradas nem limitada a um documento planificador que, delimitando áreas urbanizáveis, não obriga a que todas elas sejam efectivamente ocupadas com construção.

 

Sendo assim, compete em cada momento às autoridades concelhias legitimamente eleitas avaliar cada situação concreta e decidir de forma transparente de modo a defender o interesse público. Ora, face ao loteamento do Coto da Pena que, independentemente da sua eventual legalidade, configura na minha opinião um grosseiro desrespeito pelo património caminhense, eu gostaria de ver a Câmara Municipal de Caminha esclarecer os cidadãos deste concelho sobre as razões e as condições da sua aprovação.

 

Concretizando as questões que me parecem de urgente resposta: justificava-se a aprovação de um loteamento desta dimensão num local tão importante e sensível para o passado histórico de Caminha ? Mesmo tendo em conta a existência de eventuais direitos adquiridos pelos proprietários do terreno, não haveria forma de negociar uma qualquer permuta que salvaguardasse o Coto da Pena de mais uma agressão urbanística? Foi, pelo menos, imposta aos titulares do loteamento alguma prospecção arqueológica prévia ao início das movimentações de terras? Porque não foi respeitada a solicitação do IPPAR para a paragem das obras? Quem se responsabiliza pela eventual destruição de vestígios arqueológicos em área classificada ? Quem defende, afinal, o interesse público em Caminha?

IC1, o sacrifício de Vilar de Mouros

Junho 10, 2003

 

Quase um ano decorrido desde a consulta pública do Estudo de Impacte Ambiental do IC 1 Viana-Caminha, desvanecem-se as esperanças daqueles que acreditaram ser possível conciliar a sua construção com a qualidade de vida das populações e a defesa do património natural caminhense e, bem pelo contrário, confirmam-se os receios dos mais pessimistas, à medida que se vai conhecendo a definição final do traçado que,  sabe-se agora, passará a dez metros (!) de habitações de uma sacrificada freguesia rural como Vilar de Mouros, para sempre sufocada por um infernal garrote rodoviário.

 

Falo de Vilar de Mouros porque, aqui vivendo, conheço e sinto com mais força, mas podia falar também de Argela, com a via rasando as moradias da Guimbra ou de Lanhelas, que se arrisca a ficar com uma auto-estrada sobranceira a toda a freguesia.

 

Falo de sacrifício porque, para além do inscrito nos dicionários, algumas palavras adquirem um significado outro, mas poder-se-ia perguntar que culpa tem de expiar a terra de Vilar de Mouros para merecer o castigo de ser invadida e impermeabilizada pelo betão e pelo alcatrão, que culpa têm os vilarmourenses que pagar para que o silêncio secular tenha de ser violentado pelo rodar dos pesados camiões ou pelas travagens bruscas das máquinas vertiginosas na sua urgência em chegar a Vigo ou ao Porto.

 

Culpa e responsabilidade têm certamente aqueles que vão deixar que as retroescavadoras rasguem as encostas verdejantes do vale do Coura e do vale do Minho, destruam minas de água e poluam os rios, cortem árvores e interrompam os caminhos, afugentem de vez os animais, perturbem o sossego das crianças prestes a adormecer ou invadam as noites de insónia dos velhos.

 

Refiro-me, primeiro, aos autarcas do passado recente que, irreflectidamente, não tiveram pejo em apresentar como trunfo eleitoral em vésperas de mais uma ida às urnas, uns quilómetros extra de auto-estrada, sem pensar nas possíveis consequências para o território e as populações que os tinham escolhido.

 

Refiro-me, depois, aos governantes desse mesmo passado recente que, com habilidosas engenharias financeiras, deixaram nas mãos de empresas privadas decisões que teriam de ser sempre do Estado, abdicando assim dos princípios mais básicos de uma cultura política que os obrigava a preservar acima de tudo o interesse público.

 

Refiro-me também aos governantes do presente que, não surpreendentemente, insistem na cultura do betão a todo o custo, privilegiam a visão economicista do deve e haver, sempre movendo-se no interior do mais puro caciquismo partidário.

 

Refiro-me, finalmente, aos autarcas do presente para quem o património natural é exibido como cartaz turístico ou figura da sua retórica discursiva mas que quando se trata de acções concretas não hesitam em logo o sacrificar nos altares de um suposto progresso, comprometendo irremediavelmente o que de mais valioso temos para usufruir e oferecer a quem nos visita.

 

Contra tudo isto, que podem os cidadãos pouco e tardiamente informados, que podem os movimentos cívicos à pressa organizados, que podem os representantes locais das populações condicionados e com recursos limitados, que podem as associações ambientalistas carentes de activismo e tantas vezes ignoradas, que pode uma enfraquecida oposição, refém dos erros do passado e agindo a reboque dos acontecimentos?

 

Para estes incertos tempos que são já os do nosso presente, com novos problemas e desafios, agora sempre locais e globais em simultâneo, não servem mais as soluções do passado e urge uma outra cultura democrática que, sem pôr em causa o desenvolvimento, coloque no coração das decisões políticas a defesa do ambiente, a coesão social, a preservação da qualidade de vida dos cidadãos e, sobretudo, tenha a coragem de dizer NÃO quando esses princípios fundamentais são postos em causa.

Para Vilar de Mouros, contudo, que vai ter uma auto-estrada antes de uma simples rede de saneamento básico (!), será provavelmente demasiado tarde…

IC1 – A Câmara contra os caminhenses?

Setembro 24, 2002

 

Como todos sabemos, terminou no passado dia 18 de Setembro a fase de  inquérito público relativo aos traçados do Itinerário Complementar 1 (IC 1) entre Viana do Castelo e Caminha e respectivas ligações à Estrada Nacional 13 (EN 13). Passando por cima da questão de fundo que, verdadeiramente, nunca foi debatida pelos caminhenses — com uma auto-estrada (A3) a poucos quilómetros, seria mesmo necessária uma outra via similar rasgando as freguesias e lugares do concelho, com os tremendos impactos sociais e ambientais que tal acarretará? — registe-se a elevada participação das autarquias locais, associações ambientalistas, grupos de moradores ou cidadãos a título individual que, das mais variadas formas (expressando a sua opinião nas reuniões extraordinárias das assembleias de freguesia e da assembleia municipal que foram realizadas, produzindo documentos sobre a questão ou subscrevendo abaixo-assinados) se pronunciaram nesta fase de consulta pública, mesmo tendo em conta o período de férias com que, em grande parte, coincidiu. Foi, sem dúvida, um notável exercício de cidadania que honra os caminhenses e muitos dos seus autarcas num momento de importância magna para o concelho porque, como a grande maioria já percebeu, o traçado a construir do IC 1 condicionará em grande parte o desenvolvimento futuro do concelho e a qualidade de vida de todos os que aqui vivem, trabalham ou mesmo nos visitam.

 

Apesar das naturais diferenças de pontos de vista vindas a público sobre qual o mais adequado dos quatro traçados e das várias ligações previstas para o Vale do Âncora ou para o norte do concelho, foi-se contudo gerando um certo consenso entre a diversidade de opiniões emitidas por cidadãos, ambientalistas e autarcas, culminando na assembleia municipal extraordinária realizada em 11 de Setembro onde os presentes (e a comunicação local assim o mediatizou) perceberam que, apesar de tudo, talvez fosse possível uma solução razoável: para o traçado principal, um misto da solução 2 até ao chamado “nó de Argela”, adoptando-se seguidamente a solução 1, respeitando dessa forma o corredor do PDM de Caminha; para a ligação do Vale do Âncora, a ligação sul parecia ser a escolha da maioria e, finalmente, para a ligação norte à EN 13 em Lanhelas, como nenhuma das propostas seria aceitável pelos terríveis impactos ambientais e sociais que provocariam, propunha-se a alternativa de uma ligação um pouco mais a norte, no limite da freguesia e do concelho. Este consenso, raro e precioso dado o número e a diversidade dos interesses em presença, só oferecia vantagens: salvaguardava a solidariedade entre os caminhenses num assunto tão propício a egoísmos e, simultaneamente, ia ao encontro dos próprios interesses da empresa construtora e daqueles que receiam pelo atraso na construção do IC 1. Afinal de contas, em que região de Portugal onde se desenvolvem ou já desenvolveram processos semelhantes (e têm sido tantos, desde a nossa adesão à União Europeia), foi possível chegar a um consenso tão rapidamente, aceitando quase inteiramente soluções que nos foram impostas, com a única excepção de um desvio de dois ou três quilómetros para o qual até se oferece (concretamente, a Junta de Freguesia de Lanhelas) uma alternativa perfeitamente viável?

  

Contudo, quando tudo parecia assim resolvido em termos dos interesses largamente maioritários dos caminhenses (sobretudo, daqueles que serão mais directamente atingidos pela construção do IC 1) eis que, agora que o prazo de consulta pública já finalizou, surge surpreendentemente uma voz a quebrar o consenso: a própria Câmara Municipal de Caminha (CMC), cujo executivo acaba de divulgar a sua posição oficial: para o traçado principal do IC 1 a solução 2, penalizadora de muitos lugares de Argela; para a ligação do Vale do Âncora, a ligação sul; para a ligação a Lanhelas, a ligação C, que prevê um viaduto de 20 m de altura com uma extensão de cerca de um quilómetro por cima do Vale do Coura, cortando em dois a freguesia de Vilar de Mouros e desembocando em plena zona urbana de Lanhelas!  Mesmo o facto de reconhecer os óbvios inconvenientes de uma solução que, cito do parecer da CMC, “divide a freguesia [Lanhelas] contrariando a solução de continuidade do tecido urbano local, o que o faz resultar pouco bem-vindo” e, mais à frente, “não queremos deixar de referir que a travessia do Coura, num local onde o leito apresenta dimensão significativa, obriga a obras de arte com um impacto na paisagem pouco condizente com a qualidade cénica local”, nem isso chega para que a Câmara Municipal de Caminha a recuse liminarmente como seria seu dever, refugiando-se, pelo contrário, numa razão menor — volto a citar do parecer da CMC, “seria francamente mais favorável à vivência local se a inserção [refere-se à ligação a Lanhelas] pudesse assumir, ainda dentro do Concelho, uma inserção mais a Norte, no limite da freguesia, onde o perfil da EN melhor o comporta sem sacrifícios e onde o afluxo de trânsito não é tão comprometedor. No entanto e porque esta solução não está prevista, importa analisar as que estão previstas“[o sublinhado é meu] — que só demonstra provincianismo e subserviência. E não se argumente que propor uma pequena alteração numa ligação, aceitando em tudo o resto aquilo que é imposto, vem colocar “em risco a execução do IC1” (Informação Municipal no “Caminhense” de 20/9/02): uma autarquia que põe, acima de tudo, os interesses dos seus munícipes, não se verga perante uma qualquer empresa espanhola ou aqueles que decidem em Lisboa (ou será Madrid ?) sobre as nossas vidas. Muito recentemente, a imprensa nacional (PÚBLICO de 9/9/2002) noticiava que a Câmara Municipal de Vila do Conde, posta perante dois traçados alternativos para uma via em tudo semelhante ao IC1 tinha, pura e simplesmente, recusado qualquer deles obrigando ao redesenhar de um outro traçado (não estamos a falar de uma pequena ligação), atrasando desse modo o processo de construção em… um ano.

 

E em Caminha, como vai ser? Vai a Câmara Municipal de Caminha (muito particularmente, a sua Presidente, a quem apelo que honre o seu compromisso com a defesa das populações que a elegeram e com o ambiente natural de uma zona única no país) defender como lhe compete os caminhenses até ao fim ou, pelo contrário, sacrificá-los no altar de um “progresso” que, bem o adivinhamos, só nos vai trazer aquilo que hoje já tantos recusam em nome da qualidade de vida e da felicidade de todos?  

Nova cidadania precisa-se, também em Caminha

Janeiro 3, 2002

 

Depois de uma campanha eleitoral que terá contribuído muito pouco para o esclarecimento dos caminhenses sobre as grandes questões do concelho — com a excepção meritória dos dois debates organizados pelo Bloco de Esquerda, quase nada mais se fez nesse sentido  — e que não primou sequer pela mínima pedagogia cívica — que triste imagem de democracia a distribuição de bolas e balões à porta e dentro (!) das escolas e, sobretudo, os ataques pessoais que marcaram a campanha e o período pós-eleitoral — tomam agora posse os autarcas que nos próximos quatro anos gerirão os destinos de Caminha.

 

Na pessoa da nova Presidente da Câmara de Caminha deve aplaudir-se a eleição de uma mulher, a primeira no Alto-Minho,  para o cargo de maior responsabilidade municipal com o significado que tal facto comporta em termos histórico-culturais. Na vitória do Partido Social-Democrata, saúde-se a alternância democrática depois de vinte e cinco anos ininterruptos de gestão do Partido Socialista.

 

Contudo, alternância não implica necessariamente alternativa e, sendo ainda obviamente prematuro (e injusto) avaliar quem ainda só agora começa a trabalhar, há já fundadas razões para temer que o modelo de gestão que tem caracterizado a política autárquica concelhia — assente, genericamente, num modelo de desenvolvimento que privilegia o imediato ao futuro, o superficial ao profundo, o acessório ao essencial —  não mudará substancialmente: iludindo os tremendos impactos ambientais necessariamente em causa (para já não falar da simples racionalidade económica),  não foi a construção de uma nova ponte na foz do rio Minho, no preciso momento em que se inicia a construção de uma idêntica obra pública meia dúzia de quilómetros a montante, a grande bandeira eleitoral da nova equipa camarária ?

 

Num regime representativo caberá naturalmente à oposição partidária eleita (neste caso, na vereação e na Assembleia Municipal), ou não eleita, cumprir o seu papel de controlo do legítimo poder autárquico e de construção paulatina das propostas que em altura oportuna apresentarão ao eleitorado. Reconhecer tal facto, não significa no entanto aceitar que se esgote aí a participação cidadã como, salvo raras excepções, tem sido prática local ou nacional num contexto, já por demais identificado, de crise global do sistema democrático que, entre outras causas e consequências, tem permitido a subida constante dos níveis de abstenção e o progressivo afastamento dos cidadãos da causa pública.

 

Bem pelo contrário, uma cidadania atenta e exigente que não aceite este estado de coisas, precisa urgentemente de encontrar os fóruns que permitam alargar a participação dos cidadãos para além dos períodos eleitorais e a expressão regular da crítica fora dos restritos quadros partidários. Num momento decisivo para o concelho, quando se nos deparam importantes opções estratégicas que determinarão em grande parte o futuro de quem aqui vive e trabalha — o traçado e as ligações do IC 1, resolver o problema do assoreamento da foz do Minho e impedir o desaparecimento do areal a sul, iniciar o processo de revisão do Plano Director Municipal, decidir definitivamente o que fazer com o Teatro Valadares, etc —  talvez desse modo se possa iniciar o caminho de uma nova cidadania, também em Caminha.  

Candidaturas Autárquicas em 2001: análise crítica de um cidadão eleitor

Dezembro 6, 2001

 

Aproxima-se rapidamente a data das eleições autárquicas — momento privilegiado de participação cívica na escolha dos cidadãos que nos próximos quatro anos terão a responsabilidade de gerir o, cada vez mais importante, poder local — e estão já no terreno há algum tempo as campanhas das várias candidaturas à Câmara Municipal de Caminha. Sabemos bem não terem as eleições autárquicas no nosso concelho a dimensão mediática de muitas outras que justifiquem a atenção dos media nacionais ou mesmo regionais, mas já não deixa de ser surpreendente a total ausência na imprensa local de artigos de opinião ou análise independente sobre as propostas dos vários partidos ou coligações concorrentes e as intenções declaradas dos candidatos a Presidente da Câmara. Tal silêncio, particularmente ensurdecedor dada a importância do que está em jogo a nível concelhio, será certamente consequência da falta de uma tradição editorial crítica por parte dos órgãos de comunicação local mas, sobretudo, reflecte à nossa escala o fenómeno mais global de crise da democracia representativa e do distanciamento entre eleitores e eleitos, neste caso concreto evidente no baixo grau de atenção da grande maioria dos cidadãos eleitores face aos programas eleitorais ou às declarações dos vários candidatos, lidos/recebidos ora com adesão, ora com rejeição, a maioria das vezes com indiferença mas, e aí reside o problema, quase sempre acriticamente. É precisamente esse modesto, porque singular e limitado no espaço disponível, exercício de crítica livre de um cidadão eleitor do concelho de Caminha, que vos proponho agora acompanhar esperando sinceramente que ele possa suscitar, eventualmente por este mesmo meio, antes ou depois das eleições, muitas outras disponibilidades para o debate sério dos assuntos do nosso local comum de vida no âmbito de uma cidadania atenta e exigente face aos vários poderes, sejam eles públicos ou privados, locais, nacionais ou globais.

 

Começando pela candidatura do CDS-PP, espanta a desfaçatez de um partido político nacional com responsabilidades parlamentares que apresenta em Caminha uma lista de candidatos inteiramente de fora do concelho composta por meia dúzia de rapazinhos do Porto, recém-licenciados ou ainda a fazer os seus cursos mas, confesso, ainda mais me espanta que este autêntico insulto à inteligência de quem aqui vive e trabalha com o único propósito de fingir uma implantação local que, pelos vistos, não existe, ainda mereça na imprensa local honras de primeira página e amplas entrevistas ao seu cabeça de lista sobre assuntos que, evidentemente, desconhece por completo, dando origem a declarações tão pouco edificantes para os caminhenses como esta resposta à óbvia questão: “De facto não somos naturais do concelho, mas, por isso, poderemos constituir uma mais valia para a população. (…) na prática, o que é que os outros candidatos – de cá , têm feito?”(Caminha@2000, 24/11/01) …! Com estes pressupostos, escusado será dizer que toda e qualquer análise do conteúdo das propostas e ideias (?) da candidatura do CDS-PP seria pactuar com uma situação que só não é mais grave pelo profundo ridículo que encerra.

 

Temos depois a novidade Bloco de Esquerda (BE), que surge em Caminha reproduzindo o discurso nacional desta formação política, apelando a uma “nova cultura política” e a uma “nova outra forma de cidadania”, simultaneamente crítica e participativa, visando um “concelho de munícipes intervenientes e responsáveis” (documento de apresentação da candidatura). Saúda-se o aparecimento do Bloco em Caminha, assim como o seu apelo ao debate urgente sobre o modelo de desenvolvimento que queremos para o concelho, o desassombro de algumas declarações dos seus protagonistas relativamente aos exemplos de descaracterização urbanística ou, ainda, a prioridade dada à variável meio ambiente quando se equacionam opções estratégicas para o futuro próximo de Caminha como o traçado do IC 1, a questão da travessia do rio Minho ou a próxima revisão do Plano Director Municipal (PDM). Sendo assim, só é de lamentar que esta candidatura não surja com outra consistência política como é evidente pela ausência de um manifesto eleitoral específico para o concelho de Caminha e, consequentemente, de propostas concretas sobre a realidade local (com algumas louváveis excepções como, por exemplo, a necessidade de aquisição e recuperação do Teatro Valadares por parte da Câmara), mas também em alguma indefinição e personalização nas tomadas de posição face às mais variadas questões (“eu não sei se a opção de Caminha deve ser essa…”, “Eu não lhe sei dizer exactamente qual é a posição do BE sobre isso mas sei qual é a minha posição”, Caminhense, 16/11/01) e, sobretudo, no esquecimento das graves questões sociais que ainda afectam o concelho, algo indesculpável numa formação política de esquerda. Ficam, ainda assim, ideias bem interessantes que o Bloco assume como suas a nível nacional (o provedor municipal, os orçamentos participativos) e, principalmente, a disponibilidade para a promoção do debate local que, sinceramente, esperemos se mantenha depois do acto eleitoral.

 

Continuando pela esquerda do espectro político, encontramos a candidatura da Coligação Democrática Unitária (CDU) que, assumidamente, aspira a um lugar na vereação para o seu cabeça-de-lista, aposta legítima mas que condiciona claramente a sua estratégia eleitoral. Assim, depois de um tom consistentemente crítico face ao poder socialista ao longo do mandato que agora termina (nomeadamente na Assembleia Municipal, onde os seus representantes foram muitas vezes as únicas vozes dissonantes face a problemáticas ambientais ou sociais), a CDU surge agora, algo surpreendentemente, com um discurso redondo que evita afrontar ou problematizar — “nós gostamos mais de estar do lado das soluções e não do lado dos problemas”, “Eu não gosto de criticar o trabalho dos outros” (Caminhense, 23/11/01) — preferindo a retórica do “projecto abrangente” ou, o que vai dar ao mesmo, “projecto para Caminha”, aproveitando o que considera a “onda geral de simpatia” que rodeia os seus candidatos (Caminha@2000, 24/11/01). Quando chegamos ao campo das propostas concretas, é inegável que os protagonistas da candidatura da CDU mostram conhecimento da realidade local e não se limitam a reproduzir discursos alheios ou voluntaristas de ocasião e são naturalmente de saudar os propósitos de municipalizar o Teatro Valadares, revitalizar o centro histórico de Caminha, apostar no turismo agro-rural, ou mesmo as ideias mais genéricas como, por exemplo, a de descentralizar e potenciar o papel das freguesias ou a de motivar e valorizar os trabalhadores da autarquia. Contudo, o cuidado da CDU em não hostilizar potenciais faixas do eleitorado e não se comprometer para o futuro, fica evidente quando se optam por formulações ora ambíguas, como “protecção do ambiente sim, mas desenvolvimento também …” (Caminhense, 23/11/01), ora demagógicas como a resposta à hipótese de instalação do ensino superior no concelho (“existem todas as condições para que se possa vir a instalar um pólo no concelho”, Caminhense, 23/11/01), ora ainda populistas, como a defesa de uma “cultura mais basista, apostando no que é nosso” (Caminha@2000, 24/11/01). Enfim, tanta abrangência talvez até permita chegar a novos eleitores, mas será que a CDU de Caminha está consciente que com tão pouca esquerda — também aqui, as questões sociais, como a pobreza, estão praticamente ausentes do discurso — se arrisca a afastar outros tantos ?

 

Passando ao Partido Social Democrata (PSD), com aspirações à presidência da Câmara depois de 25 anos de poder socialista, a pública indefinição do Verão passado quanto à lista a apresentar ao eleitorado, resultou numa candidatura, sem dúvida original e simpática, mas cuja consistência política resiste dificilmente a uma análise mais fina do discurso voluntarista e algo ingénuo da sua principal protagonista. Atente-se, por exemplo, nas incongruências manifestadas quanto a questões tão importantes como o balanço da gestão autárquica do PS, o papel do PSD na oposição a essa mesma gestão ou a sua própria inserção numa lista partidária. Na verdade, chega a ser difícil acompanhar o raciocínio de quem chama a atenção para o “mau desempenho do Partido Socialista” e o “passivo muito grande” que este partido deixa no município mas, noutra ocasião, referindo-se ao ainda Presidente da Câmara socialista, elogia o seu “dom de ouvir as pessoas” (Caminha@2000, 24/11/01) ou o chega mesmo a qualificar de “bom candidato” (Caminhense, 30/11/01) ! Aliás, diga-se que também não é fácil perceber quem tão veementemente se afirma como independente e apolítica, atacando fortemente o passado recente do PSD no concelho — “todos somos independentes”, “vejo as coisas de uma forma muito pessoal”, “não sou pessoa política” (Caminha@2000, 24/11/01), “quando me diz que o PSD não fez oposição, eu até posso concordar …”, “eu não me responsabilizo por esse passivo (…) nunca fui filiada no PSD” (Caminhense, 30/11/01) — quando foi  apresentada aos caminhenses como candidata pelo próprio líder nacional do partido, Durão Barroso, e depois convida o Major Valentim Loureiro para estrela da festa do lançamento público da sua candidatura (ver Caminhense, 14/9/01,12/10/01, 16/11/01) ! A outro nível, talvez mais grave pelas consequências que acarreta, atente-se igualmente na inconsistência da posição da candidata sobre a hipótese de uma ponte em Caminha sobre o rio Minho: na citada apresentação da sua candidatura não hesitou em afirmar que “tudo faremos para que o IC 1 chegue cá rapidamente e faça a ligação a La Guardia pela futura ponte” (Caminhense, 12/10/01) mas, depois de estar presente num debate organizado pela COREMA, o discurso ficou muito mais cauteloso (felizmente, diga-se): “connosco no poder, iria exercer-se pressão para que os estudos fossem feitos, a fim de constatar se havia viabilidade ou não” (Caminha@2000, 24/11/01). Dito isto, não queremos deixar de louvar algumas das ideias da candidatura do PSD que, apesar de tudo, demonstram uma real preocupação pelos problemas do concelho, nomeadamente quando se chama a atenção para a desertificação das freguesias do interior ou se afirma que “preservar o meio ambiente é fundamental” (Caminhense, 12/10/01) ou ainda quando se chama a atenção para a inexistência de regulamentação local para a caça, pesca ou prática de desportos náuticos  ou a ausência de uma planificação estratégica concelhia (Caminhense, 30/11/01).

 

Finalmente, a candidatura do Partido Socialista (PS) que, depois de sete mandatos de poder autárquico em Caminha, gere a difícil situação de ter de assumir a responsabilidade de um passado não isento de polémica com a necessidade de apresentar novos protagonistas, criando assim a ilusão perfeita da alternância tranquila. Diga-se que, mesmo usando de uma extrema habilidade no discurso produzido, só em parte o consegue e ainda assim à custa de alguma omissão crítica que, sendo compreensível em termos eleitorais, nem por isso é menos lamentável para quem gostaria de uma maior clareza e radicalidade na vida política que dificilmente é compaginável com as estritas solidariedades partidárias. Repare-se, por exemplo, na abordagem da problemática do desordenamento urbanístico e do excesso de construção no concelho que, se por um lado, merece um louvável “o passado não nos honra”, por outro se justifica com o facto dos “conceitos, os sentimentos e o espírito de quem geria não eram os mesmos que hoje em dia” (Caminhense, 30/11/01), esquecendo-se que alguns dos casos concretos são bem recentes (entre outros, os edifícios junto à marginal do Coura em Caminha) e que, em termos gerais do concelho, não vemos qualquer inversão de tendência num modelo de desenvolvimento que não respeita as depressões naturais, as linhas de água, a permeabilização dos solos ou a estética da paisagem e que depois é o responsável pelos “desastres naturais” como o acontecido recentemente em Cristelo. Atente-se igualmente na forma como é abordada a questão do assoreamento do rio Minho (e, acrescente-se, da extracção desordenada de areias junto à marginal de Caminha e do quase desaparecimento do areal nas praias da Foz e Moledo): admite-se o problema, bem entendido, mas depois evoca-se a necessidade de mais “estudos científicos” (Caminhense, 30/11/01), quando já há indícios científicos mais do que suficientes (veja-se o artigo de J.Vasconcelos no Caminha@2000 de 4/8/01 e lembre-se o recente debate organizado pela COREMA com um especialista vindo da Galiza) para perceber que o ferry-boat foi (é) o grande responsável por toda este grave atentado ambiental. De qualquer forma, se dúvidas subsistem, encoste-se o ferry-boat enquanto se fazem os tais estudos ! Enfim, se nem tudo são rosas em Caminha, também não haverá razão para desesperar e anote-se, com agrado, a insistência da candidatura PS na importância do planeamento (e, neste âmbito, na revisão do PDM e na elaboração de planos de pormenor), e na promessa de dinamização do trabalho a nível da Biblioteca, do Museu Municipal e, ainda, de revitalização das estações arqueológicas do concelho (Caminhense, 30/11/01). Aplauda-se igualmente a fuga à demagogia fácil quando não se faz da famigerada nova ponte no rio Minho promessa eleitoral (Caminha@2000, 1/12/01) ou se reconhece não ser prioridade a instalação do ensino superior no concelho (Caminhense, 30/11/01). Em contrapartida, registe-se com preocupação, as cautelas face à compra e recuperação do Teatro Valadares — “só se for uma conclusão tecnicamente suportada e avalizada por uma entidade idónea” (Caminhense, 30/11/01). Porquê condicionar a municipalização e a recuperação do Valadares à sua transformação em Casa da Cultura se, em termos arquitectónicos e históricos, ele vale per si ?

Razões para a reeleição do dr. Jorge Sampaio

Janeiro 3, 2001

Independentemente da actual conjuntura política — mesmo assim o Dr. Jorge Sampaio é certamente o melhor garante de que não teremos eleições legislativas dentro de seis meses porque se a estabilidade não é nunca um fim em si mesmo, só se justifica interromper um ciclo político em democracia representativa em caso de grave crise institucional ou política (o que não é, obviamente, o que se passa actualmente) — convém recordar que a eleição presidencial é a de um órgão unipessoal, isto é, trata-se de escolher directamente o português MELHOR PREPARADO para assumir a mais alta magistratura nacional, trata-se de distinguir aquele que MAIS MERECE ter a honra de ser Presidente da República de Portugal neste início de um novo século.

Quanto ao primeiro aspecto, e sem entrar por uma sempre deselegante comparação com os outros candidatos, alguém terá hoje dúvidas sobre a preparação pessoal e política do Dr. Jorge Sampaio para exercer o mais alto cargo da República ? Mesmo para aqueles que nele não votaram há cinco anos, até para aqueles que não tencionam votar hoje, cremos que o primeiro mandato que agora termina será prova suficiente das excepcionais capacidades e sentido de Estado demonstradas pelo Dr. Jorge Sampaio quando, por exemplo, foi preciso levantar bem alto nos fóruns internacionais a questão de Timor ou, noutro contexto bem diverso e ainda recente, se tornou indispensável a sua serena mas firme intervenção para pôr fim a situações claramente insustentáveis para todos aqueles que, independentemente das suas opções partidárias ou posicionamentos ideológicos, não pactuam com a menor transparência na condução da coisa pública.      

Quanto ao segundo aspecto, que é afinal o mais relevante quando se trata da eleição de um órgão unipessoal, o currículo pessoal e político do Dr.Jorge Sampaio fala por si e, ao contrário de outros, vem de longe. Desde a sua activa participação e liderança na luta contra a ditadura, no movimento estudantil, primeiro, e na barra dos tribunais, depois, até à sua intervenção política no pós 25 de Abril assumindo as mais altas responsabilidades cívicas como parlamentar, líder partidário, autarca e finalmente presidente da república, as suas atitudes e acções foram constantemente inspiradas pelos mais altos ideais de justiça social, mas também sempre caracterizadas por um grande inconformismo e coragem pessoais.

Por tudo isto, o Dr. Jorge Sampaio é uma referência ÉTICA para a sua geração, mas igualmente para as gerações mais jovens que vêem nele não um modelo, porque os modelos copiam-se e emulam-se acriticamente o que seria contrariar tudo o que o Dr. Jorge Sampaio sempre defendeu, mas sim um EXEMPLO de que é possível fazer política com coerência e de acordo com os mais elevados princípios, sem contudo os querer impor aos outros, na sua diversidade, como virtudes únicas ou imutáveis.

Por tudo isto, o Dr. Jorge Sampaio é uma referência POLÍTICA para todos aqueles que pensam que o fim da história nunca chega e que, por debaixo da espuma dos dias e para além da demagogia debitada para os telejornais das oito, há ainda muito a fazer no combate contra as velhas e novas formas de exclusão social, há ainda muito caminho a percorrer no sentido do aprofundamento da Democracia, usando convictamente os instrumentos da pedagogia cívica mas também afrontando, sempre que for preciso, os interesses económicos ou políticos instalados e dominantes.

Por tudo isto, urge exercer o mais elementar, mas igualmente o mais importante, direito e dever de cidadania e, no próximo dia 14 de Janeiro, votar e reeleger o Dr. Jorge Sampaio para Presidente da República de Portugal.